Tupolev Tu-95: o mais fantástico turboélice da história Entre centenas de aeronaves militares soviéticas, o Tupolev Tu-95 é, talvez. um dos mais bem sucedidos. Quase 60 anos após o seu primeiro voo, continua operacional Força Aérea Russa, e sua carreira parece estar longe de se encerrar. De fato, o Tu-95, tal como o bombardeiro americano Boeing B-52, sobreviveu a muito dos seus sucessores, e é um verdadeiro ícone da história da aviação.
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O Tu-95 escoltado por um Mig-29 |
A história do Tu-95 remonta ao final dos anos 40. Nessa época, no início da Guerra Fria, um dos maiores problemas estratégicos das forças armadas soviéticas era a sua incapacidade de ameaçar o território dos Estados Unidos com bombardeiros estratégicos. Os bombardeiros Tupolev Tu-4, copiados de uma aeronave Boeing B-29 americano internada na Rússia durante a Segunda Guerra Mundial, ficaram rapidamente obsoletos, assim como uma variante ampliada desse avião, o Tu-85. Equipados com motores a pistão, essas aeronaves não tinham alcance e nem capacidade de sobreviver a uma guerra em território americano.
Os militares soviéticos emitiram uma ordem para os Escritórios de Projetos de Andrey Tupolev e Vladimir Myasishchev, visando conceber uma aeronave de bombardeio estratégico, com alcance suficiente para ameaçar o território dos Estados Unidos. Para tanto, o avião deveria ter um alcance superior a 8 mil Km, sem reabastecer, e carregar pelo menos 11 toneladas de bombas.
O Escritório Tupolev estava com um grande problema nas mãos. Ao abandonar os motores a pistão, ficou difícil encontrar um propulsor adequado para o avião. Os motores turbojatos AM-3, que estavam sendo propostos para um bombardeiro intercontinental, revelaram ter um consumo de combustível incompatível com os requisitos de alcance pedidos pelos militares.
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Um Tu-95 acompanhado de perto por um F-4 da Marinha Americana
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Tupolev considerou, então, a possibilidade de utilizar motores turboélices. Esses motores tinham consumo muito menor que os famintos turbojatos, e possibilitariam uma velocidade intermediária entre os jatos e os aviões a pistão, além do desejado alcance intercontinental.
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Trem de pouso principal
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O motor turboélice seria fornecido pelo Escritório de Projetos Kuznetsov, teria entre 11 e 12 mil SHP, e acionaria hélices contra-rotativas de 8 pás. A proposta de Tupolev foi selecionada oficialmente em 11 de junho de 1951, e o protótipo rapidamente começou a ser construído.
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Torre de cauda, com dois canhões de 23 mm
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Ao contrário do seu revolucionário grupo motopropulsor, o protótipo tinha uma estrutura bastante convencional. Aerodinamicamente, no entanto, era muito evoluído, pois usava asas enflechadas em 35 graus, para melhorar as características de voo a alta velocidade. Esse enflechamento tinha a vantagem adicional de fazer com que as longarinas principais das asas passassem pela fuselagem à frente do compartimento de bombas, aumentando o seu volume útil.
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Desenho em 4 vistas do Tu-95
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Pouco mais de um ano após a construção, o primeiro protótipo estava pronto. Utilizando motores Kuznetsov 2TV-2F, que eram, na verdade, dois turboélices TV-2 acoplados a uma única caixa de redução, o avião decolou para o seu primeiro voo no dia 12 de novembro de 1952, sob o comando de Alexey D. Perelet. Infelizmente, falhas nas caixas de redução dos motores terminaram por provocar um acidente com o avião, em 11 de maio de 1953, no 17º voo de testes. O aviâo pegou fogo em voo, caiu, e Perelet e mais três tripulantes morreram. Até que um motor melhor e definitivo fosse desenvolvido, o projeto ficou praticamente paralisado. O segundo protótipo foi equipado com os mais confiáveis motores Kuznetsov NK-12, de 12 mil SHP, em fevereiro de 1955, e foi muito bem sucedido. (vide artigo sobre o motor NK-12 nesse blog:
http://culturaaeronautica.blogspot.com.br/2011/10/kuznetsov-nk-12-o-mais-poderoso-motor.html).
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Parte inferior do nariz do Tu-95
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Depois de uma fase de testes, durante 1955, a produção seriada do avião começou em janeiro de 1956. A Força Aérea Soviética designou o avião como Tu-20, quando a aeronave começou a ser entregue às unidades operacionais, em 1956, enquanto a designação interna da Tupolev era Tu-95. Embora a designação Tu-20 fosse rapidamente abandonada na União Soviética, por um longo tempo os americanos continuaram a chamar o avião de Tu-20. A OTAN designou o avião com o nome de código "Bear" (urso).
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Decolagem de um Tu-95
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A princípio, embora o Tu-95 se constituísse em uma assustadora ameaça para os americanos, o Departamento da Defesa (DoD) não estava muito impressionado. Avaliaram a aeronave como capaz de atingir 400 MPH (644 Km/h) de velocidade máxima e de um alcance de 7.800 milhas (12.500 Km). O DoD, no entanto, teve que rever esses valores, para cima, muitas vezes.
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Motores NK-12 e hélices do Tu-95
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O Tu-95 revelou ser uma aeronave confiável, poderosa e versátil, com características inéditas. Equipado com quatro gigantescos motores NK-12, cuja potência, posteriormente, chegou a 14.800 SHP, o avião conseguia desenvolver até 920 Km/h de velocidade máxima, subir 10 m/s (aproximadamente 2.000 pés por minuto), superando muitos jatos contemporâneos. A excepcional eficiência dos motores NK-12 permitiu um extraordinário alcance de 15.000 Km (8.100 Milhas Náuticas) sem reabastecimento, e um teto de serviço de 13.700 metros, ou 45 mil pés (note-se que a aviação russa usa o Sistema Métrico Decimal para velocidade, alcance, potência e outras unidades de medida). Em termos de desempenho operacional, o Tu-95 é praticamente equivalente ao seu rival americano, o Boeing B-52, outra aeronave poderosa, versátil e longeva. A título de comparação, o B-52 tinha velocidade um pouco maior, 960 Km/h, mas menor alcance, 12.000 Km.
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Dois Tupolev Tu-95, ao lado de um Boeing B-52
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A missão inicial do Tu-95 era carregar bombas nucleares de queda livre, mas desenvolvimentos posteriores mostram a versatilidade da aeronave, que depois ganhou capacidade de conduzir mísseis de cruzeiro, fazer patrulhamento marítimo e guerra eletrônica. Até mesmo uma aeronave civil de passageiros, o Tu-114, foi desenvolvida a partir de dois protótipos Tu-95 convertidos para transporte militar Tu-116. Essa versatilidade fez com que o avião continuasse em produção até 1992.
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Ainda operacionais, os Tu-95 foram acompanhados por gerações de caças ocidentais, como esse F-22 Raptor americano
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É claro que a aeronave tem os seus defeitos. Seu nível de furtividade é praticamente nulo. É melhor classificá-la como aeronave "ostensiva", pois é impossível que passe despercebida de qualquer meio de detecção. Sua "assinatura" de radar não somente é enorme, mas claramente caracterítica, devido às hélices gigantes. O ruído produzido pelas hélices em alta velocidade é, literalmente, ensurdecedor, embora as caixas de redução limitem sua velocidade de rotação a 750 RPM. O Tu-95 é considerado a aeronave militar mais barulhenta da história, e pode ser detectado, pelo ruído, até de submarinos mergulhados. Os militares americanos consideram esse ruído intimidador, mas, na verdade, é um fator de vulnerabilidade do avião em ambiente de guerra.
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As enormes hélices contra-rotativas do Tupolev Tu-95
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As hélices contra-rotativas de 8 pás é uma das características mais notáveis do Tu-95. Embora girem a apenas 750 RPM, as pontas começar a entrar em velocidade supersônica a Mach 0,75, a velocidade de cruzeiro econômica do avião. Todavia, como a maior parte do empuxo é produzido pelas estaçôes internas da hélice, essa permanecem eficientes até Mach 0,85, embora produzam um ruído espantoso.
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Os enormes trens de pouso do Tu-95 |
Em 1958, o bombardeio por bombas de queda livre já era impraticável, e o avião começou a ser modificado para carregar mísseis e equipamento de reabastecimento no ar, além de abastecimento por pressão centralizado em um único bocal, e, em meados dos anos 60, as aeronaves portadoras de mísseis Tu-95K-20 tiveram seus aviônicos atualizados, sendo designadas como Tu-95KM. Esses aviões levavam mísseis de cruzeiro Kh-20M, com um alcance máximo de até 600 km. Os mísseis Kh-20M, designados pela OTAN como AS-3 Kangaroo, foram os maiores mísseis aerotransportados até hoje fabricados. e ficaram em serviço até 1970.
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Trem de pouso do nariz, longo o suficiente para manter as hélices afastadas do chão
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Em 1963, o Escritório de Projetos Tupolev começou a desenvolver uma nova geração de Tu-95KM, capazes de levar mísseis Kh-22 Raduga, com sistema de orientação autônomo e destinado a destruir os grupos de porta-aviões de combate americanos, bem como alvos fixos costeiros. Por várias razões, o desenvolvimento foi adiado, e o primeiro avião remodelado voou pela primeira vez só em 30 de outubro de 1973. Em 1987, tal aeronave entrou finalmente em serviço ativo. Os mísseis Kh-22 Raduga eram ligeiramente menores que os Kangaroo, e podiam, assim como esse, levar ogivas nucleares de até 800 kilotons, ou armamento convencional.
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O míssil Kh-20 "Kangaroo", o maior míssil aerotransportado já produzido
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Em setembro de 1979, a versão "definitiva" do Bear, o Tu-95MS, designada internamente pela Tupolev como Tu-142, voou pela primeira vez. Essa versão, equipada com mísseis, continuou em produçao até 1992. Os soviéticos estavam desenvolvendo uma aeronave substituta, que acabou sendo cancelada com o colapso da União Soviética em 31 de dezembro de 1991, e mantiveram os antigos Tu-95 em serviço ativo.
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O espaçoso cockpit do Tu-95 |
Os Tu-95MS que estão em serviço atualmente foram fabricados nas décadas de 80 e 90. Seus dois pilotos sentam-se lado a lado, em um espaçoso cockpit, e operam manches de volante convencionais. Atrás dos pilotos ficam o engenheiro de voo, à direita, e o operador de rádio, à esquerda. Atrás do engenheiro, existe uma pequena cozinha, equipada com fogão elétrico, e um banheiro químico. Atrás do operador de rádio, fica o operador de armas defensivas, e um operador de guerra eletrônica. No cone de cauda, um artilheiro opera os canhões de 23 mm. Existem dois compartimentos pressurizados, um à frente e outro à ré, e nenhum tripulante dispõe de assento ejetável.
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Versões do Tu-95
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Muitas outras versões foram fabricadas. Um modelo Tu-95V foi utilizado para lançar a Tsarbomb, a mais poderosa de todas as bombas termonucleares já fabricadas, sobre a ilha de Novaya Zemlya, no Ártico, em 1961. Um modelo Tu-95LAL fez 34 voos com motores Kuznetsov NK-14a nucleares instalados no lugar dos NK-12 internos, também em 1961. Era o protótipo para o cancelado projeto Tu-119, e um dos raríssimos aviões movidos por energia nuclear na história.
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Interior do Tu-95
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Durante a Guerra Fria, os voos dos Tu-95 eram acompanhados de perto pelos caças da OTAN, pela ameaça que representavam. Chegavam a voar tão próximos que as tripulações se viam e se cumprimentavam, embora teoricamente fossem "inimigos". O maior problema dos pilotos de caça da OTAN, nessas missões, era aguentar o ruído quase insuportável dos NK-12 dos Tupolev em cruzeiro.
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Tu-95 exposto em Zukhovsky
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Sem substituto a vista, o Tu-95MS continua em serviço ativo, 28 aeronaves Tu-95MS-6 e 35 Tu-95MS-16. Outras 23 aeronaves estão na Ucrânia, provavelmente inativas, mas em condições de ser reativadas. O Presidente da Rússia, Vladimir Putin, em 2007, ordenou a reativação da linha de produção dos Tu-95, e a Tupolev tem trabalhado nisso desde então. As previsões de vida útil da aeronave, que vem sendo continuamente atualizada em seus equipamentos, alcançam até 18 anos, e é de se esperar que os Tu-95 se mantenham em serviço ate 2040, feito que a tornará uma das mais longevas aeronaves militares da história, com mais de 80 anos de serviço ativo, comparável apenas ao bombardeiro americano B-52.
Fonte: Cultura Aeronáutica