[Brasil] Mais duas ou três coisas sobre a neblina
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[Brasil] Mais duas ou três coisas sobre a neblina
O Globo
Quarta-feira, 4 de julho de 2012
Mais duas ou três coisas sobre a neblina
A falta que faz um ILS nas aeronaves e nos aeroportos brasileiros
ARTUR XEXÉO
SEGUNDO CADERNO
Há algo estranho nos aeroportos do Brasil além dos aviões de carreira. Nesta época do ano, uma época propícia a neblina, os atrasos são constantes, e as desculpas são sempre as condições meteorológicas que impedem as aeronaves de pousar e, consequentemente, de decolar. Voos matutinos se transformaram em ilusão, e o tráfego no céu brasileiro só começa mesmo depois de 10h da manhã. Esta humilde coluna tratou do assunto no último domingo e recebeu alguns comentários que esclarecem a questão.
Comecemos com o e-mail de René Milazzo, que se apresenta como um “fã das ciências aeronáuticas”:
“Esclareço que o impeditivo de as aeronaves decolarem sob nevoeiro (definição mais técnica do que neblina) é porque, em caso de eventual pane nesta fase do voo, nem sempre é possível elas retornarem à origem no modo visual.
“Saliento que já existe há muito o ILS, Instrument Landing System, um sistema de aproximação por instrumentos (sinais de rádio VHF/ UHF solo-avião), que dá uma orientação precisa ao avião que esteja pousando. Quase todos os aeroportos de porte possuem este sistema.
“Para se ter uma ideia, Heathrow, em Londres, que apresenta frequentemente teto e visibilidade zero, usa a versão 3-C do ILS, capaz de ‘capturar’ a aeronave a 54 milhas do aeroporto e trazê-la em segurança ao solo sem qualquer ação do piloto!
“Curiosamente, já tivemos este equipamento por aqui... Já tivemos. Prefiro não comentar por que não o temos mais, porém não é difícil deduzir os motivos, típicos do jeito tupiniquim de administrar as coisas.
“Se os ILS estivessem operando, as aeronaves voariam em qualquer condição meteorológica, em qualquer horário, em qualquer parte do nosso continental país de Dilma. Sem ele, haja caminhadas pelos Congonhas da vida, o que é bom para melhorar o condicionamento físico e o conhecimento de novos títulos nas livrarias.”
Então é isso? Os aeroportos e as companhias aéreas põem a culpa nas condições meteorológicas, mas, na verdade, a culpa é deles, que não estão atualizados.
A mensagem de Jorge Nunes de Oliveira, controlador de tráfego aéreo, amplia a nossa discussão:
“Li o seu artigo na Revista O GLOBO, reportando o seu atraso, causado por nevoeiro, em um voo. Esse incidente, que acontece quase que diariamente, varias vezes por dia, principalmente nos meses mais frios do ano, em diversos aeroportos brasileiros, causando transtornos a milhares e milhares de pessoas, até hoje não recebeu o devido tratamento por aqueles que se dizem responsáveis pela segurança da aviação brasileira. Fica muito mais fácil colocar a responsabilidade sobre os ombros de São Pedro do que tomar medidas concretas para solucionar o problema de uma vez por todas instalando equipamentos que permitam às aeronaves pousarem com praticamente zero de visibilidade e teto, como acontece na maioria dos aeroportos da América do Norte, da Europa e da Ásia.
“O povo, que não entende nada do assunto, como sempre aceita tudo passivamente, pois, contra a natureza, ninguém pode. Neste caso, pode, sim. Basta instalar os equipamentos necessários. Gostaria que o senhor soubesse que nos Estados Unidos, onde o número de aeronaves é dez vezes maior que no Brasil (cerca de 230 mil), a Federal Aviation Administration está instalando um sistema chamado Next Gen, que permitirá reduzir os atrasos nos voos para algo em torno de cinco minutos, já considerados prováveis problemas de meteorologia. Na Europa, o Eurocontrol, constituído por cerca de 26 ou 28 países, está unificando os procedimentos para diminuir os atrasos para algo em torno de três a cinco minutos, implantando o chamado Sesar. Lá eles possuem equipamentos chamados de ILS, GNSS, RNPs, rede de satélites que conduzem a aeronave até o ponto de toque também com visibilidade zero. Nesses países, existem investimentos pesados em infraestrutura aeronáutica (controle de tráfego aéreo e instalações aeroportuárias).
“Nesses países, existe uma indústria aeronáutica eficiente e com qualidade dos serviços, há respeito e compromisso com o usuário e busca incessante para atingir a excelência. Existe competitividade, o que não acontece por aqui. A Aeronáutica, como responsável pelo sistema de controle de tráfego aéreo, mantém um controle rígido sobre a atividade e sobre as empresas que desejam, de alguma forma, ingressar na atividade. Não existe uma política de incentivo às empresas destinadas a pesquisa e desenvolvimento. Toda a minha vida, dediquei-me de corpo, alma e espírito ao controle de tráfego aéreo, sonhando que algum dia seríamos parecidos com os países desenvolvidos. Puro engano. Hoje, prestes a me aposentar, vejo que, infelizmente, ao que parece, juntamente com alguns colegas que também acreditavam nessa possibilidade, perdemos a batalha.”
Quarta-feira, 4 de julho de 2012
Mais duas ou três coisas sobre a neblina
A falta que faz um ILS nas aeronaves e nos aeroportos brasileiros
ARTUR XEXÉO
SEGUNDO CADERNO
Há algo estranho nos aeroportos do Brasil além dos aviões de carreira. Nesta época do ano, uma época propícia a neblina, os atrasos são constantes, e as desculpas são sempre as condições meteorológicas que impedem as aeronaves de pousar e, consequentemente, de decolar. Voos matutinos se transformaram em ilusão, e o tráfego no céu brasileiro só começa mesmo depois de 10h da manhã. Esta humilde coluna tratou do assunto no último domingo e recebeu alguns comentários que esclarecem a questão.
Comecemos com o e-mail de René Milazzo, que se apresenta como um “fã das ciências aeronáuticas”:
“Esclareço que o impeditivo de as aeronaves decolarem sob nevoeiro (definição mais técnica do que neblina) é porque, em caso de eventual pane nesta fase do voo, nem sempre é possível elas retornarem à origem no modo visual.
“Saliento que já existe há muito o ILS, Instrument Landing System, um sistema de aproximação por instrumentos (sinais de rádio VHF/ UHF solo-avião), que dá uma orientação precisa ao avião que esteja pousando. Quase todos os aeroportos de porte possuem este sistema.
“Para se ter uma ideia, Heathrow, em Londres, que apresenta frequentemente teto e visibilidade zero, usa a versão 3-C do ILS, capaz de ‘capturar’ a aeronave a 54 milhas do aeroporto e trazê-la em segurança ao solo sem qualquer ação do piloto!
“Curiosamente, já tivemos este equipamento por aqui... Já tivemos. Prefiro não comentar por que não o temos mais, porém não é difícil deduzir os motivos, típicos do jeito tupiniquim de administrar as coisas.
“Se os ILS estivessem operando, as aeronaves voariam em qualquer condição meteorológica, em qualquer horário, em qualquer parte do nosso continental país de Dilma. Sem ele, haja caminhadas pelos Congonhas da vida, o que é bom para melhorar o condicionamento físico e o conhecimento de novos títulos nas livrarias.”
Então é isso? Os aeroportos e as companhias aéreas põem a culpa nas condições meteorológicas, mas, na verdade, a culpa é deles, que não estão atualizados.
A mensagem de Jorge Nunes de Oliveira, controlador de tráfego aéreo, amplia a nossa discussão:
“Li o seu artigo na Revista O GLOBO, reportando o seu atraso, causado por nevoeiro, em um voo. Esse incidente, que acontece quase que diariamente, varias vezes por dia, principalmente nos meses mais frios do ano, em diversos aeroportos brasileiros, causando transtornos a milhares e milhares de pessoas, até hoje não recebeu o devido tratamento por aqueles que se dizem responsáveis pela segurança da aviação brasileira. Fica muito mais fácil colocar a responsabilidade sobre os ombros de São Pedro do que tomar medidas concretas para solucionar o problema de uma vez por todas instalando equipamentos que permitam às aeronaves pousarem com praticamente zero de visibilidade e teto, como acontece na maioria dos aeroportos da América do Norte, da Europa e da Ásia.
“O povo, que não entende nada do assunto, como sempre aceita tudo passivamente, pois, contra a natureza, ninguém pode. Neste caso, pode, sim. Basta instalar os equipamentos necessários. Gostaria que o senhor soubesse que nos Estados Unidos, onde o número de aeronaves é dez vezes maior que no Brasil (cerca de 230 mil), a Federal Aviation Administration está instalando um sistema chamado Next Gen, que permitirá reduzir os atrasos nos voos para algo em torno de cinco minutos, já considerados prováveis problemas de meteorologia. Na Europa, o Eurocontrol, constituído por cerca de 26 ou 28 países, está unificando os procedimentos para diminuir os atrasos para algo em torno de três a cinco minutos, implantando o chamado Sesar. Lá eles possuem equipamentos chamados de ILS, GNSS, RNPs, rede de satélites que conduzem a aeronave até o ponto de toque também com visibilidade zero. Nesses países, existem investimentos pesados em infraestrutura aeronáutica (controle de tráfego aéreo e instalações aeroportuárias).
“Nesses países, existe uma indústria aeronáutica eficiente e com qualidade dos serviços, há respeito e compromisso com o usuário e busca incessante para atingir a excelência. Existe competitividade, o que não acontece por aqui. A Aeronáutica, como responsável pelo sistema de controle de tráfego aéreo, mantém um controle rígido sobre a atividade e sobre as empresas que desejam, de alguma forma, ingressar na atividade. Não existe uma política de incentivo às empresas destinadas a pesquisa e desenvolvimento. Toda a minha vida, dediquei-me de corpo, alma e espírito ao controle de tráfego aéreo, sonhando que algum dia seríamos parecidos com os países desenvolvidos. Puro engano. Hoje, prestes a me aposentar, vejo que, infelizmente, ao que parece, juntamente com alguns colegas que também acreditavam nessa possibilidade, perdemos a batalha.”
cwbspotter- Tenente-Brigadeiro
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